CNDH e Plataforma Dhesca visitam Santa Quitéria, no Ceará, em missão sobre projeto de mineração de urânio e fosfato a céu aberto

O Conselho Nacional dos Direitos Humanos – CNDH e a Plataforma de Direitos Humanos Dhesca Brasil visitam o Ceará entre os dias 31 de agosto e 02 de setembro. O objetivo é verificar eventuais violações de direitos humanos decorrentes do projeto de exploração mineral em Santa Quitéria, no estado, a partir das demandas da comunidade afetada e do diálogo com autoridades.

O Projeto Santa Quitéria envolve a exploração mineral de fosfato (voltado à produção de fertilizantes e ração animal) e urânio (para enriquecimento no exterior e transformação em combustível a ser usado em usinas nucleares brasileiras, como Agra) no município de mesmo nome, localizado no Ceará.

Participam da missão pelo CNDH os conselheiros Carlos Vilhena e Everaldo Patriota, a conselheira Virginia Berriel e a assessora técnica Ana Cláudia Macedo. Pela Plataforma Dhesca, participa Guilherme Zagallo. Entidades parcerias no estado também integram o grupo.

A programação prevê a visita in loco da área de empreendimento, na Fazenda Itataia, município de Santa Quitéria. Integrantes da missão também vão realizar a oitiva de povos e comunidades tradicionais atingidos pelo Projeto Santa Quitéria, a ser realizada no Assentamento Morrinhos. O prefeito foi convidado a participar.

Em Fortaleza, CNDH e Plataforma Dhesca realizam uma audiência pública e solicitam reuniões com a governadora do estado e com representantes do Poder Legislativo. No último dia, está prevista uma reunião de avaliação dos integrantes da missão, com definição de estrutura do relatório a ser elaborado para a sociedade.

Denúncias

Em maio deste ano, a Mesa Diretora do CNDH recebeu representantes do Movimento Pela Soberania Popular na Mineração – MAM, que denunciaram a aprovação de empreendimento voltado à exploração de urânio e fosfato a céu aberto e por meio de explosões.

O MAM apontou o risco de grave ameaça aos direitos humanos e socioambientais no estado do Ceará devido ao impacto no açude Edson Queiroz, às pilhas de rejeitos e aos potenciais riscos para a saúde humana e ambiental. Segundo a entidade, o empreendimento pode atingir 156 comunidades rurais, 30 territórios de povos e comunidades tradicionais e cinco etnias indígenas, com impacto em 4.2 milhões de pessoas potencialmente atingidas (direta e indiretamente). Denunciaram ainda que não houve consulta prévia, livre, informada e de boa-fé, estudo de componente indígena nem de componente quilombola.

Histórico

O interesse na exploração mineral da jazida de Santa Quitéria existe pelo menos desde a década de 1980, com a promessa de lucros para empreendedores, fornecimento de fertilizantes ao setor agropecuário e de combustível a usinas nucleares, além da geração de postos de emprego durante as obras e a operação na região a ser explorada.

Os riscos, porém, têm sido apontados desde então por órgãos competentes, devido à necessidade massiva de recursos hídricos em uma região assolada pela falta de água; a geração de rejeitos de urânio, potencialmente nocivos à saúde; e o posicionamento de parte da sociedade civil de que a exploração pode se refletir em poucos benefícios econômicos em contraponto a violações de direitos humanos imensuráveis.

Em junho de 2022, o CNDH expediu a Recomendação nº 20 de 2022, na qual recomenda ao Ibama a suspensão do licenciamento ambiental do Projeto Santa Quitéria devido à inobservância do procedimento de consulta e consentimento prévio, livre, informado e de boa-fé aos povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais afetados, impactados ou atingidos, conforme determinação da Convenção nº 169 da OIT da qual o Brasil é signatário.

O conselho aponta no documento que não foi verificada a existência de autorização ou licença prévia para o licenciamento nuclear na Comissão Nacional de Energia Nuclear – CNEN; que em 2014 foi expedida recomendação pelo Ministério Público Federal sobre a suspensão de audiências públicas referentes mesmo Projeto Santa Quitéria, em razão da inexistência de autorização ou licença prévia da Comissão Nacional de Energia Nuclear; e que informações referentes às questões hídricas e nucleares encontram-se ausentes do Estudo de Impactos Ambientais e do Relatório de Impactos ao Meio Ambiente, e, portanto, do material utilizado para as audiências públicas.

Segundo informa o parecer técnico “Análise das Omissões e das Insuficiências do Estudo e do Relatório de Impacto Ambiental (EIA-Rima) Referentes ao Projeto Santa Quitéria de Mineração de Urânio E Fosfato”, assinado pelo Painel Acadêmico sobre os Riscos da Mineração de Urânio e Fosfato, o projeto proposto pela empresa Indústrias Nucleares do Brasil (INB) já passou por dois processos de licenciamento ambiental (2004 e 2010), tendo sido anuladas pela Justiça Federal as licenças prévia e de instalação, e negado outro pedido de licença prévia diante da insustentabilidade hídrica do empreendimento. O mesmo problema foi apontado pelo Ibama durante o processo de licenciamento ambiental ocorrido entre 2010 e 2019.

O parecer aponta que o empreendimento de mineração e beneficiamento de urânio e fosfato tem como parte integrante e fundamental de seu processo produtivo a lavra, produção, beneficiamento, transporte, armazenamento e disposição de material radioativo (minério colofanito, em que estão associados o fosfato e o urânio). Desse modo, conforme a Resolução Conama nº 237, de 19 de dezembro de 1997, é considerado como de significativo impacto ambiental em nível nacional ou regional, competindo o licenciamento ambiental ao Ibama.

A INB já recebeu pelo menos 11 autos de infração entre 2009 e 2022 pelo Ibama por violações da legislação ambiental, sobretudo na mina de Caetité (8 autuações), com multas que, somadas, chegam a R$ 6,9 milhões, conforme consulta realizada pela Plataforma Dhesca no sistema do Ibama.

Sobre o CNDH

O CNDH é um órgão colegiado de composição paritária que tem por finalidade a promoção e a defesa dos direitos humanos no Brasil através de ações preventivas, protetivas, reparadoras e sancionadoras das condutas e situações de ameaça ou violação desses direitos, previstos na Constituição Federal e em tratados e atos internacionais ratificados pelo Brasil.

Instituído inicialmente pela Lei nº 4.319, de 16 de março de 1964, que criou o Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), o colegiado foi transformado em Conselho Nacional dos Direitos Humanos pela Lei n° 12.986, de 2 de junho de 2014. O CNDH desempenha sua missão institucional tendo como orientação os Princípios Relativos ao Status das Instituições Nacionais de Direitos Humanos (Princípio de Paris), definidas pela ONU em 1992, marcados pelo pluralismo e pela autonomia.

Sobre a Plataforma Dhesca

A Plataforma de Direitos Humanos – Dhesca Brasil é uma rede formada por 45 organizações e articulações da sociedade civil, que tem como objetivos desenvolver ações de promoção e defesa dos direitos humanos e incidir em prol da reparação de violações.
Constituída em 2002, a Plataforma Dhesca Brasil tem como princípio a afirmação de que todas as pessoas são sujeitas de direitos e, como tal, devem ter todos os direitos assegurados para garantir as condições de vida com dignidade.

Mais informações

Conselho Nacional de Direitos Humanos
Email: cndh@mdh.gov.br
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