ANM adia eliminação completa de barragens a montante no Brasil

A Agência Nacional de Mineração (ANM) postergou o prazo para a eliminação completa de barragens de rejeitos de mineração construídas com o mesmo método das estruturas que se romperam no país desde 2015, segundo publicação no Diário Oficial da União desta segunda-feira, causando algumas críticas de especialistas.

Embora o uso de tais barragens ainda possa ocorrer, novos alteamentos de barragens pelo método conhecido como a montante foram proibidos após o desastre em unidade da Vale em Brumadinho (MG), que deixou mais de 240 mortos e um rastro de destruição.

Na ocasião, a agência também determinou que tais estruturas a montante —quando as paredes da barragem são construídas sobre uma base de resíduos, em vez de em material externo ou em terra firme— fossem desativadas até 2021 e totalmente fechadas até 2023.

Agora, a descaracterização das barragens deverá acontecer até setembro de 2022 para unidades com volume de até 12 milhões de metros cúbicos; até setembro de 2025 para barragens com entre 12 milhões e 30 milhões de metros cúbicos; e até setembro de 2027 para barragens com volume acima de 30 milhões de metros cúbicos, segundo a resolução.

Já o prazo para desativar permanece até 2021.

“A prática de fazer descomissionamento e descaracterização de barragens é uma novidade para todo o setor mineral brasileiro. Quando colocamos o prazo de 2021 na Resolução 4, era uma prerrogativa que a gente tinha pela urgência do assunto, mas o setor ponderou bastante que, às vezes, no apressar de uma descaracterização, podemos gerar um novo desastre”, justificou em nota o diretor da ANM, Eduardo Leão.

O ex-superintendente do órgão federal ambiental em Minas Gerais, Julio Grillo, ponderou que, para algumas barragens, o prazo inicial parecia mesmo ser curto. Ele ressaltou que, em alguns casos, é necessária a construção de estruturas para assegurar potenciais desastres, e os prazos se somam.

No entanto, Grillo frisou que oito anos para descomissionar “parece ser exagerado”. “O risco permanecerá em parte durante todo este tempo”, afirmou à Reuters.

Para o professor Carlos Martinez, da Universidade Federal de Itajubá e da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o prazo anterior estava apertado, principalmente devido a demora em agir das mineradoras.

“A ANM tem que cobrar e fiscalizar para não ter que postergar novamente esse prazo. A fraqueza do Estado faz com que os interesses privados se sobreponham à segurança do povo a despeito das evidências e riscos de novos desastres.”

Também está previsto, na nova resolução, que empreendedores com barragens a montante ou de método desconhecido deverão concluir até 15 de dezembro de 2019 projeto técnico de descaracterização das estruturas, contemplando no mínimo sistemas de estabilização da barragem existente ou construção de nova estrutura de contenção à jusante.

As obras desses sistemas de estabilização de barragem ou de construção de nova estrutura de contenção deverão ser concluídas até 15 de setembro de 2021.

“É vedada a realização de novos alteamentos, exceto se assim exigido no projeto técnico executivo… para fins de descaracterização”, apontou a ANM, acrescentando que o não atendimento do prazo implicará na interdição da barragem até cumprimento.

As barragens de mineração alteadas a montante ou por método desconhecido em operação no momento poderão permanecer ativas até 15 de setembro de 2021, desde que observadas algumas condições, dentre elas de segurança. Anteriormente, o prazo era 15 de agosto de 2021.

A resolução também aponta que empreendedores com barragens de mineração para disposição de rejeitos que estejam em operação, independente do método construtivo, deverão até 15 de dezembro concluir estudos “visando à identificação e eventual implementação de soluções voltadas à redução do aporte de água operacional nas barragens”.

Empreendedores com barragens de mineração ativas ou inativas também deverão fazer no mesmo prazo estudos sobre soluções técnicas para evitar aporte de água superficial e subterrânea no reservatório em desacordo com o projeto.

A técnica de alteamento a montante foi utilizada tanto na barragem que se rompeu em Brumadinho, quanto em estrutura da Samarco (joint venture da Vale com o Grupo BHP,) que entrou em colapso em novembro de 2015, em Mariana (MG).

Procurada, a Vale reiterou seu compromisso de eliminar completamente as nove barragens a montante que ainda tem, que já estão desativadas. O objetivo, segundo ela, é que nos próximos três anos todas estejam descomissionadas ou com fator de segurança adequado e sem oferecer risco às pessoas e ao meio ambiente.

A empresa afirmou ainda que “cumpre integralmente a legislação em vigor e cumprirá os prazos conforme aplicáveis”.

Na resolução desta segunda-feira, a ANM também ressaltou o objetivo de minimizar o risco de rompimento “em especial por liquefação”.

O Ministério de Minas e Energia disse em julho avaliar que o desastre em Brumadinho foi gerado por liquefação —processo em que água penetra na barragem e faz com que o material sólido perca sua resistência, e que foi a causa do rompimento de Mariana.

A resolução da ANM ainda define outras obrigações para barragens, inclusive quanto à instalação de sistemas de monitoramento em tempo real.

Segundo a ANM, hoje no Brasil existem 61 barragens a montante, sendo que 41 delas são em Minas Gerais. Amapá, Bahia, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Pará, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo são os outros Estados que têm este tipo de barragem.

A matéria na íntegra está disponível Comitê Nacional em Defesa dos Territórios Frente à Mineração.

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