Articulação Internacional dos Atingidos e Atingidas pela Vale vai à Europa denunciar crimes da mineração no Brasil 

Grupo vai se reunir com investidores, políticos e representantes de organismos internacionais em 7 países para discutir corresponsabilização por mortes e outras violações causadas pelo extrativismo mineral

Representantes de movimentos de atingidos pela mineração iniciam jornada de denúncia por países da Europa a respeito das violações de direitos do setor mineral no Brasil e no mundo por empresas da cadeia minero-siderúrgico, que através do seu capital transnacional acirram conflitos e desigualdades. 

A agenda inclui participação nas atividades da Campanha Global pelo Desmantelamento do Poder Corporativo, reuniões com relatorias especiais da ONU, audiências com membros do parlamento europeu e do parlamento alemão, representantes da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), de investidores da Vale S.A. e de empresas compradoras dos minérios extraídos no Brasil, além de debates públicos e ações de protesto .

A Articulação Internacional de Atingidas e Atingidos pela Vale será representada  por Carolina de Moura Campos, coordenadora geral da Associação Comunitária da Jangada – Brumadinho, por Marcela Rodrigues, familiar de vítima do rompimento da barragem I da Vale em Brumadinho, Danilo Chammas, advogado popular da organização  Justiça nos Trilhos, que atua na defesa de comunidades impactadas pela Vale na Amazônia e em Minas Gerais e Antonia Flávia da Silva Nascimento, moradora da comunidade de Piquiá de Baixo, Açailândia, Maranhão, impactada pela siderurgia e pela ferrovia da Vale. Até o dia 5 de novembro, o grupo irá  denunciar os crimes da mineração para investidores, parlamentares e organismos internacionais na Espanha, Suíça, Alemanha, Holanda, França, Itália e Bélgica. 

O início da jornada deu-se com a participação no programa “Cidades Defensoras de Direitos Humanos”, na Catalunha, Espanha. O próximo destino será Genebra, Suíça, para participar da sessão do grupo de trabalho das Nações Unidas para um tratado vinculante para responsabilizar empresas por violações de direitos humanos e da natureza. Em paralelo, o grupo fortalecerá as atividades do Sínodo da Amazônia que está acontecendo em Roma neste mesmo período. 

Nos próximos dias o objetivo é denunciar a impunidade corporativa da Vale e das empresas a ela associadas, a ameaça de retomada das operações no complexo Paraopeba, em Brumadinho (mina da Jangada), a falta de compromisso real da empresa e do Estado brasileiro com as medidas de reparação integral e de garantias de não repetição em Brumadinho e Bacia do Rio Doce, em Minas Gerais, e em Piquiá de Baixo, em Açailândia, na Amazônia Brasileira.

Será relevante também demonstrar a relação de causa e efeito entre as ações de empresas europeias em geral, e alemãs em particular, e as violações de direitos humanos e danos ambientais no Brasil, com especial destaque para os crimes da Vale S.A.. Para Carolina de Moura Campos, “É fundamental que se divulgue na Europa a dramática situação do Brasil. Estamos saturados de projetos extrativistas que geram mortes cruéis e uma destruição ambiental irreversível. É de conhecimento público que a Vale mente e engana a sociedade. Os processos de reparação acontecem com uma lentidão absurda, baseados em acordos controlados pela empresa. Eles implementam o terrorismo de barragens para se apropriar dos territórios. Vivemos em pânico diante do risco de novos rompimentos de barragens. Só no entorno de Belo Horizonte existem 19 barragem em situação de emergência.”

Entre os dias 12 e 15 de outubro haverá a Sessão do Grupo de Trabalho da ONU sobre o tratado vinculante para empresas e direitos humanos e a Semana de Mobilização dos Povos. Na sequência, reuniões com parlamentares alemães serão essenciais para defender a criação de uma lei na Alemanha e outra em toda a Europa sobre a devida diligência em relação a toda a cadeia de valor. O objetivo é criar mecanismos para que as empresas se comprometam a fiscalizar a origem das matérias primas que utilizam na fabricação de seus produtos e imponham condições às mineradoras e produtoras de ferro-gusa.

No dia 14 de outubro, o grupo estará na suíça para a “Conférence-débat: Vale détruit nos vies et la planète”. Como destaca estudos do Instituto de Justiça Fiscal (IJF), apenas com a Vale, entre 2009-2015, o Brasil perdeu US$ 12,4 bilhões em impostos devido ao subfaturamento das exportações da empresa. Basicamente, a Vale exporta para si mesma em paraísos fiscais com preços subfaturados, o que diminui o pagamento de impostos proporcionais (como, por exemplo, a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais CFEM). Deste modo, a Vale se utiliza de manobras fiscais usando a Suíça como entreposto. Após a venda com valor abaixo do mercado para seu próprio escritório na Suíça, ela revende o produto ajustado ao valor do mercado.  

Uma das atividades mais importantes acontecerá no dia 22 de outubro, às 19h,  em Berlim, onde haverá o painel de discussão “Rompimento fatal duma barragem no Brasil: qual responsabilidade trazem as empresas alemanas?”, que tratará da responsabilização das empresas alemãs ao que se refere a cadeia de produção. Um grande exemplo é o atestado de estabilidade da barragem I da Vale pela empresa alemã TÜV SÜD. O atestado foi dado há apenas 4 meses antes do rompimento em Brumadinho.  

O caso mostra que as empresas alemãs devem ser legalmente obrigadas a garantir a devidas diligências para os direitos humanos em suas atividades no estrangeiro. Isso é a demanda da Iniciativa de lei sobre a cadeia de suprimentos, formada por 64 organizações da sociedade civil, incluindo o Centro Europeu para os Direitos Constitucionais (ECCHR) e MISEREOR. 

Durante toda a viagem serão realizadas denúncias referente a falência do modelo mineral no Brasil, as pretensões de avanço da mineração sobre a Amazônia e povos indígenas; as ameaças e ataques ao sistema de proteção ambiental e em especial o automonitoramento de barragens, que tem se mostrado ineficiente e tem trazido insegurança e pânico a milhares de pessoas. Danilo Chammas afirma que “há algo que às vezes não percebemos, é que na verdade a mineração mata todos os dias. Existe um modelo que é aplicado não só no Brasil, mas também em outros lugares que é muito predatório e irresponsável. Os impactos provocados pela mineração em larga escala envolvem a remoção de pessoas, mortes violentas, doenças, contaminação do ar, da água e do solo. Com tudo isso, ainda temos que lidar com a cumplicidade de algumas empresas, investidores, bancos e governos europeus.”

A Jornada se encerra com um ato em memória dos 4 anos do rompimento da barragem do Fundão, da Samarco/Vale/BHP. O ato tem como objetivo  a solidariedade internacional, como forma de dignificar as vítimas, não deixando o crime cair no esquecimento e denunciar a impunidade. Além de relembrar os perigos à vida e integridade física e psíquica por que têm passado os defensores de direitos humanos e da natureza no Brasil. 

 

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