A espionagem feita pela mineradora Vale e pelo Consórcio Construtor Belo Monte de ativistas e movimentos sociais, descoberta há cerca de um ano, continua sem ações efetivas por parte do governo brasileiro. Diante disto, organizações de direitos humanos estão agindo no sentido de investigar as denúncias e propor recomendações ao governo.
A Federação Internacional de Direitos Humanos (FIDH) e a Organização Mundial contra a Tortura (OMCT) realizaram, no marco do Observatório para a Proteção dos Defensores de Direitos Humanos, uma missão de investigação que percorreu Belém, São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro, em fevereiro deste ano. Durante esse período, os advogados Alexandre Faro e Jimena Reyes conversaram com a sociedade civil, vítimas, movimentos sociais, representantes do governo, da Vale, do Consórcio Construtor de Belo Monte e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Alexandra Montgomery, advogada de uma das organizações vítimas da espionagem, a Justiça Global, explicou, em entrevista a Adital, que a intenção da missão era ver o momento processual dos casos e verificar o que estava sendo feito pela Justiça. Ela afirma que, durante o período de apuração das denúncias, ficou clara a falta de avanço e empenho nas investigações por parte do Ministério Público, que recebeu as primeiras denúncias ainda em 2013.
“No Ministério Público Federal de Altamira (Estado do Pará) estavam dando andamento às investigações, mas não conseguimos ter acesso ao que estava sendo feito, pois a ABIN [Agência Brasileira de Inteligência] pediu que o processo fosse tratado com sigilo”, disse Alexandra, revelando a interferência de agentes do governo no bom andamento do processo.
A advogada também informou que os procuradores responsáveis pelo caso nos cinco estados estão declinando os processos para as justiças estaduais. “As denúncias envolvem cinco estados, é interessante que os procuradores vejam que isso é um fenômeno que cruza estados, não é de competência da esfera estadual”.
No próximo mês de abril, a missão de investigação tornará público um relatório com conclusões e recomendações ao governo brasileiro, organizações internacionais e mecanismos nacionais, regionais e internacionais de proteção aos direitos humanos. Contudo, desde já, os testemunhos e documentos recolhidos durante a missão parecem confirmar que a Vale e Belo Monte praticaram delitos de corrupção, acesso à informação, usurpação de identidade, acesso ilícito a bancos de dados públicos e demissão de funcionários sem justa causa.
A Justiça Global acredita que os delitos tenham sido praticados com a cumplicidade de agentes do Estado. Em seu site, a organização denuncia: “Alguns documentos demonstram subornos a agentes do Estado e um possível apoio da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) no caso de Belo Monte, e de agentes da ABIN licenciados no caso da Vale, tudo isso contra atores e ONGs considerados por essas empresas como possíveis travas em suas atividades”.
Entenda
Em 2013, foram descobertos dois casos de espionagem e infiltração em movimentos sociais. No dia 24 de fevereiro do ano passado, integrantes do Movimento Xingu Vivo para Sempre descobriram a presença de um homem, identificado como Antônio, que estava gravando uma reunião de planejamento da qual participavam organizações ambientais e de direitos humanos de dentro e fora do Brasil, que acompanham o caso da população afetada pela represa Belo Monte e atuam pelo cumprimento das leis.
No outro caso, após a revelação de um ex-funcionário, descobriu-se que a Vale espionava movimentos sociais, organizações da sociedade civil e sindicalistas por meio de escuta telefônica, interceptação de e-mails e acesso ilegal a informações. Apesar de o caso ter sido descoberto apenas em 2013, acredita-se que a espionagem acontece há vários anos.
Matéria: Por Natasha Pitts, Da Adital.