“pela madrugada o sal na moleira e o ícone daquela geração [soberba] prefere a lama ante à água com mãos mecânicas regojizam a geologia daquela serra outonal (…)”
No dia 25 de janeiro de 2019, a barragem da mina córrego do feijão, em Brumadinho (MG), rompeu e deixou um rastro de destruição nas águas da bacia do Paraopeba. O rio ou mar de lama matou 272 pessoas, a maior parte trabalhadora da mineradora Vale S.A. Dois anos após o rompimento, mais um trabalhador Júlio César de Oliveira Cordeiro morre soterrado enquanto operava uma retroescavadeira em uma cava de rejeitos da mineradora, na mesma área onde ocorreu o crime. Além da morte de mais um trabalhador terceirizado da Vale, alguns outros desafios ainda requerem denúncia, organização e luta na bacia do Paraopeba.
Neste cenário do marco de dois anos, a Articulação Internacional dos Atingidos e Atingidas pela Vale lança uma programação que objetiva denunciar as violações que ainda estão acontecendo na bacia do Paraopeba: paralisação dos auxílios financeiros emergenciais sendo que a autonomia por renda foi agravada pela pandemia do coronavírus; falta de acesso à água até hoje em algumas comunidades; áreas que ainda não foram reconhecidas como atingidas, mas tiveram impactos do rompimento; e a falta de transparência no acordo entre a Vale e o governo do estado de Minas Gerais, que parece reduziu recursos para a reparação em Brumadinho, não contemplando todos os direitos da população atingida.
A Articulação publicou no fim do ano passado uma carta denúncia reivindicando a participação informada para a população do Paraopeba e descrevendo outras violações cometidas pela Vale na região. As ações que serão realizadas durante marco dos dois anos do crime da Vale em Brumadinho continuarão dando visibilidade em nível nacional e internacional a esses conflitos. Acompanhe a programação e nos ajude a divulgar.
Programação
Campanha Rompendo a Máscara especial Brumadinho – todas as quintas-feiras do mês de janeiro
Lançamento Ep#05 do Podcast Vozes que Vale(m) sobre Brumadinho – 25 de janeiro às 13h
Projeções de denúncia em Belo Horizonte – 25 de janeiro à noite
Live Territórios Minerários: muito além da lama parte 2 – 28 de janeiro às 19h
*O trecho que abre este texto faz parte da poesia intitulada “Brumadinho Revisitada” escrita por Charles Trocate, educador popular e companheiro do Movimento Nacional pela Soberania Popular da Mineração (MAM).
BRUMADINHO REVISITADA
pela madrugada
o sal na moleira
e o ícone daquela geração
[soberba
prefere a lama
ante à água
com mãos mecânicas regojizam a
[geologia
daquela serra outonal
[em intimo duelo
arrasto pela lírica-o toldo sangue e a economia dos seus abismos que predam corações]
senhores-essa sintaxe masculina do poder
o apregoado dos olhos denota
é o favo agudo que estrondas a pedra
[derradeira
os afazeres do grito
o alfazema do jardim e teu pulso
o relicário antigo
a criança que já não podemos ver o gesto
há em ordem alfabética um silêncio andante
chega-gritará os outros?
a estética do ferro desbotou o horizonte
e os cadáveres
implicarão novos dízimos
outras violetas que a nação
[apodrecem
eu beijei
um a um membro efetivo da canga mineral- são os animais que bestializamos
e tornamos sal e estrume esquecidos no objeto industrial.
Charles Trocate
Brumadinho [MG]
fevereiro de 2019